sábado, 23 de julho de 2011

Para não dizer que te amo

Uma mensagem de texto me desapertou da extensa aula sobre empreendedorismo. Colocou meu corpo em alerta e acelerou meu coração quando vi o remetente. Uma dúvida tremenda sobre abrir ou não a mensagem... Sai da sala discretamente e a matéria que já me preocupava agora era quase certeza de reprovação, no entanto, nada disso me importava. Buscava coragem para excluir a mensagem sem ler.

A historia que há meses eu tentava enterrar surgia novamente com força sobre meus pensamentos. Desci até o primeiro andar, na busca de tomar um café, me distrair, relaxar da tensão. Na cantina encontrei um colega do primeiro ano, conversamos sobre o curso, sobre as novidades, talvez mais do que ele desejasse. Eu nunca havia sido tão simpático e expansivo com ele, inconscientemente eu estava adiando a decisão. Pedi o meu café e ele se foi, uma nova mensagem chegou em meu celular e eu decidi desligá-lo. Tirei do bolso meu MP4, escolhi no álbum do Cazuza a música Preciso dizer que te amo e levando meu café busquei o local mais vazio da cantina. “É que eu preciso dizer que eu te amo. Te ganhar ou perder sem engano”. Sozinho, não suportei a chegada do primeiro refrão e interrompi a música. Irritado guardei o aparelho na mochila e alcancei O Senhor dos Anéis: A Sociedade do Anel, na esperança de ocupar minha mente com uma narrativa que não fosse sobre minha vida.

“Tudo o que temos de decidir é o que vamos fazer com o tempo que nos é dado”, disse Gandalf a Frodo e eu fiquei pensando se ele não dizia para mim... A história de Frodo me entreteu pouco e logo também o livro me cansou. A continuação não poderia ser diferente, eu liguei novamente o celular e percebi que a segunda mensagem era de outra pessoa. Rafa me convidava para um churrasco no domingo. E o alivio foi pouco, porque na caixa de entrada ainda permanecia a primeira mensagem e enquanto eu encostava a testa na mesa refletindo sobre o que fazer o celular vibrou novamente trazendo um novo texto do emitente indesejado. O meu temor não era pelo conteúdo da mensagem, mas sim o que eu responderia, tinha a certeza que aquele texto pedia urgência, cobrava, apontava algum aspecto que eu estava tentando abafar com uma vida atarefada. Em meu coração não havia duvidas do quanto às mensagens eram desejadas, mas o medo do que fazer com elas era o que me consumia.

Estefani chegou sem avisar e sentou bem próxima a mim. Com a roupa mais curta que uma garota consegue usar em uma sexta à noite para ir a faculdade. Sorriu com sua boca carmim, animadamente bagunçou mais meus cabelos encaracolados perguntando aonde iríamos. A cena me distraiu um pouco, pude sorrir e dizer que nunca fomos em lugar nenhum em três anos de curso e até o fim dele não iríamos. Ela sorriu mais ainda, conhecedora de mim não aguardava outra resposta, disse que estariam em um barzinho próximo e mesmo com a cara que eu estava poderia aparecer se quisesse, mas que era preciso: “deixar longe aquele livro horroroso”. Seguiu sobre seu sapato altíssimo e fiquei pensando o que tínhamos em comum, tanto ela quanto eu estávamos perdidos naquele curso.

Dani me ligou e não consegui disfarçar a voz embargada. Discreta me questionou pouco, mas com seu jeito meigo me ofereceu colo. Abri uma falsa gargalhada para lhe garantir que tudo estava bem e ela fingindo acreditar sorriu também. Ligou para falar sobre um passeio ao MASP. Como sempre, lhe pedi um tempo para pensar, que depois responderia. Finalizamos a chamada e rumei para a saída do prédio. Não tinha mais desejo de abrir a mensagem e pensava agora em mudar o número do celular. Que bobagem! Diria-me o meu amigo Bruno. Você quer abrir não quer? Então abre! “... te ganhar ou perder, sem engano”, cantou Cazuza sem qualquer fone em meu ouvido.

A cidade estava acessa, a noite era fria e o vento gelado me levou para o ponto de ônibus, maltratando meu rosto que estava congelando. Milagrosamente o coletivo chegou rápido e havia lugar para sentar. Do bolso da calça jeans tirei o celular, agora mudo depois de tanta rejeição. Abri a primeira mensagem: “Ei kde vc na miha vda? To c/ saudades!”. Sorri, fiquei pensando na resposta, mas decidi abrir a segunda: “Pq nao me responde bobao? Me esqueceu?”. “... o que vamos fazer com o tempo que nos é dado”. Respondi: “pensei em dizer q estava ocupado, mas na verdade não respondi para não dizer que te amo”.

IMAGENS:
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2 comentários:

  1. Que suspense! Enquanto você não queria ler eu estava morrendo de curiosidade. Muito bom Gil, esse texto consegue prender a atenção do leitor, para que ele queira saber o que há na misteriosa mensagem.

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  2. Ahhhhhhh eu gosti mtooo daqui! rs.

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